Opinião

Podemos pensar que cada um dos personagens deste filme é um verso de um poema sombrio e pessimista. Compõem, na forma e no conteúdo, o ambiente social claustrofóbico, opressor e extremamente vigilante em que vivem os cidadãos iranianos sob a ditadura teocrática. Quando se fala em cinema, o Irã vem com aquela força política que só a arte é capaz de imprimir. Aqui não é diferente, inclusive porque um dos nove personagens é justamente um cineasta tentando, às duras penas, fazer seu filme que sofre cada vez mais intervenções e proibições, por não falar do islã e por depor contra o regime. Qualquer semelhança com tantas histórias reais recentes não será mera coincidência.

CRÔNICAS DO IRÃ nos apresenta nove histórias curtas, mas muito potentes. Encurralados, cada um dos personagens enfrenta uma situação cotidiana, que deveria ser inofensiva. Nós o vemos interagindo com outra pessoa, mas esta outra pessoa nunca aparece na tela. Só ouvimos sua voz, como se fosse um interrogatório. E de fato é. Um rapaz, por exemplo, é entrevistado pela autoridade responsável por fornecer a carteira de motorista; o pedido é negado simplesmente porque ele tem o corpo tatuado e porque usa uma camiseta do Mickey. Uma garota é acusada de sair da escola com um rapaz de moto e é seriamente ofendida; outra é acusada de não usar devidamente o véu para dirigir; outra ainda é assediada em entrevista de trabalho e outra, agora uma menina, sai com a mãe pra comprar uniforme escolar, que vai cobrir, dos pés à cabeça, sua expressão, sua música, sua liberdade de expressão.

Mulheres sufocadas e humilhadas; homens acuados e pressionados;. burocratas autoritários que abusam do poder com sua comunicação violenta e abusiva. Cumprem ordens pra garantir que o sistema rode neste limite do absurdo de um pai, por exemplo, que vai ao cartório registrar o filme e não tem permissão pra chamá-lo Davi, porque é ocidental demais e islâmico de menos.

Teerã está na abertura e no fechamento deste filme e colapsa. Mesmo se, vista de fora, parece vibrante, quando olhamos pra dentro através da experiência do cidadão comum, se torna humanamente insustentável.