UM FILME INACABADO – Shtikat Haarchion

Cartaz do filme UM FILME INACABADO – Shtikat Haarchion

Opinião

O documentário Marcha da Vida, sobre a travessia a pé de jovens e sobreviventes dos campos de concentração à Auschwitz e Birkenau na Polônia, como faziam os judeus na guerra, me fez lembrar desde documentário que vi há pouco. Foi premiado no Sundance Festival, mas acho que infelizmente ainda não está disponível no Brasil.

Trata-se de um filme feito pelos alemães para ser usado a favor da máquina de propaganda nazista. Até aí, nenhuma novidade. É mais do que sabido que eles manipulavam e editavam as imagens até onde lhes convinha, para mostrar ao mundo a “maravilha que era viver em um gueto ou em um campo de concentração”. A novidade aqui é que esses específicos 60 minutos de filme não foram editados, não tinham trilha sonora e portanto mostram, nua e cruamente, a realidade por que passaram os judeus na Segunda Guerra, especificamente no gueto de Varsóvia. A filmagem foi feita em maio de 1942, portanto três meses antes de o gueto ser fechado e de seus habitantes serem enviados ao campo de concentração. Daí o nome do documentário: A Film Unifinished – Um Filme Inacabado.

Aqui tudo é mostrado sem rodeios ou meias palavras: vemos as crianças mendigando, o trabalho forçado, a falta de comida, higiene e habitação dignas, a diferença entre judeus ricos e pobres ressaltada pelos nazistas no filme. Impressiona ver os corpos largados nas ruas sendo recolhidos em carrocinhas e lançados em valas comuns e o terrível ritual chuveiro-câmara de gás. Mas é a pura realidade, que os alemães não tiveram tempo de editar. Encontrado por uma equipe de pesquisadores e transformado neste documentário, a riqueza dos detalhes de A Film Unfinished serviu e serve até hoje como referência para tentar reconstruir aquela época, para fazer filmes sobre o assunto e sobretudo como prova cabal (como se ainda precisasse de alguma…) do terror do Holocausto. Interessante dizer que são entrevistadas alguns sobreviventes dos campos, que revivem na tela sua infância ou adolescência, e é encenada uma entrevista com um cinegrafista que participou do projeto dos filmes de propaganda política de Hitler e que recorda ter filmado as atrocidades dos guetos. Interessante ouvir o relato de quem viu o extermínio atrás das lentes e fez o registro histórico. É patético ver os judeus jantando elegantemente e comprando livremente na feira, como parte da farsa e da mentira, enquanto os judeus-atores tropeçavam nos corpos espalhados nas ruas. Já naquele tempo, a manipulação da imagem tinha um poder inestimável.

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