A CAMINHO DE KANDAHAR – Safar e Ghandehar

Cartaz do filme A CAMINHO DE KANDAHAR – Safar e Ghandehar
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Opinião

“O amor é capaz de atravessar a escuridão da burca?” Nafas, afegã que vive no Canadá

Assim como vários diretores iranianos, Mohsen Makhmalbaf, pai da também cineasta Hana Makhmalbaf, diretora de Green Days, vive fora do Irã. O regime do ditador Mahmoud Ahmadinejad adota descaradamente o caminho da censura, repressão, violência e prisão para tirar de cena pessoas, artistas e profissionais que tenham algo a dizer contra ele. Ou que simplesmente tenham algo a dizer.

Apesar disso – e por causa disso – a produção cinematográfica vai de vento em popa, sempre mostrando a cultura do Irã e dos países vizinhos como o Afeganistão. Em A Caminho de Kandahar, o diretor escancara todas as mazelas implantadas pelo regime opressor do Taliban neste país, assim como os rastros de destruição humanitária deixados por governo corrupto, extremista, teocrático, islâmico e machista. O filme mostra a crueldade das cicatrizes em cenas impressionantes, através da narrativa da viagem da jornalista Nafas (Nelofer Pazira), que precisa chegar à Kandahar para encontrar a irmã e impedir que ela se mate. Depois da separação ainda pequenas, quando fugiam do país para se fixar no Canadá, não se encontraram mais. Na ocasião, Nafas e a família deixaram a irmã para trás após ela ser gravemente ferida nas pernas em um dos campos minados afegãos. Nafas recebe uma carta da irmã dizendo que não consegue mais viver e que vai se suicidar após o último eclipse do século 21. Ela então começa a viagem até Kandahar pelos desertos inóspitos e desumanos, tentando se infiltrar numa das tantas caravanas de refugiados afegãos que retornam ao país pela fronteira com o Irã.

O caminho de Nafas é cruel em todos os sentidos, mas tem uma pitada de esperança na figura do “médico” que encontra pelo caminho. Ainda há quem se preocupe em simplesmente cuidar dos outros. Na maior parte dos casos, o trajeto é coberto de malandros e oportunistas; gente desconfiada e desconfiança; gente mutilada física e emocionalmente; gente faminta e miserável; mulheres cobertas e infelizes; sem rosto e sem identidade.

As cenas são de uma beleza incrível – e de uma crueldade atroz. Homens mutilados apelam no acampamento da Cruz Vermelha por um par de pernas, por uma mão, por algo que os faça dormir, ou parar de chorar; homens mutilados correm desesperadamente em busca da esperança que se resume no par de pernas lançados de paraquedas pelos helicópteros da Cruz Vermelha nesse território inclemente; mulheres de burca cruzam o deserto sem rosto, sem vontades, sem vida – coloridas sim (o visual que o diretor produz a partir daí é de arrepiar), mas com alma sem cor, sem brilho, sem nome, embora ainda vaidosa. São apenas algumas das cenas, mas garanto que vale o todo, o contexto, o aprendizado que chega sobre a intolerância, sobre o que ela é capaz de fazer com um povo e com a relação entre as pessoas. Como dizem os personagens, a esperança para quem tem fome é o pão; para quem tem sede, a água; para quem vive coberta, ser vista. Disse tudo. Imagine ver o mundo através dos pequenos buracos de uma burca. Conseguiu? Eu não fui capaz.

 

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