FILHOS – VOGTER

Cartaz do filme FILHOS – VOGTER

Opinião

Especial para a 74ª Berlinale

Claro que é a maternidade que está no centro de FILHOS — e é claro que ela me toca especialmente. Através de uma história absolutamente claustrofóbica e em ritmo de thriller em que tudo pode mudar de uma hora para outra, o diretor Gustav Möller faz um cinema bem realista como os dinamarqueses sabem fazer. Diretor também de Culpa, Gustav volta a eleger um ambiente só, pelo qual o personagem é definido e em que temos dificuldade de enxergar além.

Essa sensação é proposital. Ao tratar do microcosmos prisional, Gustav fala do comportamento humano. Não sabemos nada mais de Eva, feita pela maravilhosa Sidse Babbet Knudsen, além do fato de ela ser carcereira. É respeitada em seu pavilhão, onde estabeleceu uma boa relação com os presos. Até que um dia, no pavilhão de segurança máxima, chega Mikkel e Eva fica obcecada com sua presença. “Mais do que mostrar a vida na prisão, a ideia era construir o filme baseado na psicologia da personagem”, diz o diretor na coletiva na Berlinale. “Filmamos numa prisão de verdade, de modo que tudo que vemos ali é real. Me interessa trabalhar em ambientes restritos porque, assim, tenho que encontrar formas criativas de contar a história.”

Verdade. Não conhecemos Eva sem uniforme. Onipresente na tela, a vemos oscilando entre o poder institucional da prisão e da autoridade, e o poder emocional que é exercido na segunda metade do filme. A relação de Eva com Mikkel entra no campo privado e o que vem à tona é o paradoxo o tempo todo. Na primeira camada, a maternidade no amor e no medo, no afeto e na rejeição; mais profundamente, vemos os polos opostos em que a humanidade está calcada, de reabilitação e redenção. Sempre trabalhamos com extremos e rótulos, eliminando as especificidades que nos fazem diferente e plurais; silenciando as diferenças que nos completam e enfatizando o quanto somos definidos por prisões psicológicas em que nos metemos.

FILHOS está cheio de silêncios, é preenchido pelo vazio dos corredores da prisão e pelo vazio interior dos personagens. E nós vamos também nos perdendo nesses imensos abismos, sem saber qual é a natureza de cada um, mas com a certeza de que entre os extremos do bem e do mal, moram a raiva, a tristeza, o medo, a alegria, a compaixão. Começo e termino com a maternidade, com a pergunta que não quer calar: seria mesmo incondicional o amor de mãe?

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