MEMORY
Opinião
Michel Franco levou o Grande Prêmio do Júri em Veneza em 2020 por um filme completamente diferente de MEMORY. Em Nova Ordem, Franco está no México e faz um filme perturbador sobre a lógica financeira e social do mundo. “O desafio é não se repetir como diretor”, diz ele na coletiva de imprensa em Veneza. “Fazer cinema é a maneira que encontro de me expressar, o que significa que agora já estou me sentindo melhor.”
De fato, aqui a angústia é mais íntima, mas não menos universal, e vem revestida de amor. Franco investe nas relações de confiança, apesar de tudo, e na possibilidade de escapar da sombra do passado pra reestruturar o presente. Em MEMORY, seu segundo filme em inglês, temos a personagem de Sylvia (Jessica Chastain) que mora com a filha adolescente e já de cara ficamos sabendo que ela está sóbria há 13 anos. A cena que abre é uma reunião do AA. Ela trabalha na assistência social diretamente acolhendo pessoas com problemas de saúde mental, relaciona-se com a irmã, mas não quer nem ouvir falar da mãe.
O que transforma a vida de Sylvia é o encontro com um homem em uma festa da turma do high school da irmã. Saul (Peter Sarsgaard) vai despertar nela suas mais profundas memórias e abrir as cicatrizes. Franco disse que morre de medo de perder a consciência e por isso trazer a demência para o filme foi uma maneira de lidar com esse temor, já que ninguém quer falar disso.
“Sylvia é uma mulher que usou o trama pra proteger sua filha e se proteger de outras violências”, diz Jessica. “O bonito é que ela vai se abrir para alguém que não tem memória do passado, que não está preso às experiências antigas e vive totalmente no presente.” Franco discute, assim, a memória. Experiências dolorosas ficam sufocadas dentro de nós, mas não desaparecem. São aquilo que nos tornamos. Um filme delicado e humano sobre saúde mental e sobre as relações (de)formadas e (trans)formadas.
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