EU NÃO FAÇO A MENOR IDEIA DO QUE EU TÔ FAZENDO COM A MINHA VIDA

Cartaz do filme EU NÃO FAÇO A MENOR IDEIA DO QUE EU TÔ FAZENDO COM A MINHA VIDA

Opinião

“Um dia eu me olhei no espelho e do nada disse para mim mesmo: não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida. Daí surgiu o título. E na verdade, ainda não sei. Mas tudo bem. Descobri, conversando com algumas pessoas, que é normal. A maioria das pessoas não sabe o que está fazenda da vida”. Num momento de crise, Matheus Souza solta essa pérola e a pega emprestado para o título de seu segundo longa, depois de Apenas o Fim, com Érika Mader (um projeto experimental, feito sem dinheiro, em uma só locação dentro da faculdade, escrito a partir das limitações – uma delícia de assistir). “Eu realmente não sabia o que fazer e filmar sem dinheiro é muito difícil”, conta ele. “Este é um filme que nem é tão alternativo a ponto de ir bem em festivais, nem uma comédia romântica que vá bem de bilheteria. É um filme suicida, do ponto de vista do produtor. Mas fazia quatro anos desde meu primeiro longa e achei que precisava lançar outro projeto.”

Por que tanta crise? Matheus tem somente 24 anos, mas já imprimiu um estilo todo pessoal. Confesso aqui, na boca pequena: quando entrei no filme, primeiro dia de festival, chegando às pressas em Gramado, não lembrei que esse era o mesmo diretor de Apenas o Fim. O que foi uma ótima experiência, identificar a linguagem e maneira de filmar de um diretor já nas primeiras cenas. A cena inicial, diga-se de passagem, é genial. Própria do universo jovem (e aqui estendo para outras gerações jovens, não somente esta que se diz “geração virtual, geração y”). Sentados na praia, jovens procuram uma maneira de matar o tempo. Assista, não tem quem não tenha feito esta brincadeira – e quem não tenha sugerido fazer hoje, com os filhos!

Fato é que, identificada a linguagem de Matheus, matei na hora que era o mesmo sujeito de Apenas o Fim. A protagonista Clara (Clarice Falcão) é uma jovem estudante de medicina, que acaba escolhendo este curso porque sua família é constituída praticamente de médicos. “O personagem é muito parecido comigo, com qualquer jovem. Mesmo quem sabe o que vai fazer, em algum momento se questiona se fez a escolha certa”, conta Clarice. “Esta é uma preocupação muito presente na vida de qualquer jovem”. E Clara é assim. Cabula aula porque não se interessa pelas matérias e divagando sobre o que fazer com seu tempo e suas relações, encontra um amigo que vai ajudá-la a montar estratégias de como descobrir que profissão escolher. “É um filme naturalista, não cabia uma construção profunda do personagem. Trouxe muito de mim para o filme.” E realmente, a produção é a cara de Clara.

Quanto ao tema do filme, claro que reflete o universo que do diretor Matheus Souza, de 24 anos. “O que eu sei fazer é falar de mim, sobre as pessoas com quem convivo. Meu único mérito é ser egocêntrico”, diz ele. “Nossa geração cresceu assistindo aos desenhos da Disney, Cavaleiros do Zodíaco. Todos os conceitos já estavam mastigados, cresci já sabendo o que era o amor, amizade, família, honra. De repente, quando chego aos 17 anos, passo por situações graves e vejo que as coisas não são como ensinaram que seria.

Temos uma grande dificuldade de lidar com os sentimentos. Ficamos perdidos. Somos afogados pelas internet, por todas as informações possíveis, redes sociais e tudo mais, no universo particular do nosso quarto. Tem-se tudo, e não se tem nada. Falta carinho, contato. Minha intenção era mostrar a jornada de Clara em direção ao humano, mostrar que ela tem um valor, que ela pode ser amada”, arremata Matheus.

Conseguiu, é isso que a gente sente. Não há como não se identificar. Perguntada se já sabe o que vai fazer da vida, Clarice responde: “O fato de termos muitas informações e opções, faz a gente experimentar. Sou atriz mas também escrevo séries e teatro, canto, componho.” Não ter uma reta traçada, mas vários pontos de interesse, é uma maneira de fazer acontecer. E que venha o que tiver que vir! Retrato do jovem, com maturidade e humor.

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