ENTRE DOIS MUNDOS – Le Quai De Ouistreham

Opinião
Embora a palavra empatia esteja um tanto quanto desgastada, precisamos dela mais do que nunca. Está ficando cada vez mais difícil se colocar no lugar do outro. Algo como ser capaz de fazer movimentos que nos tirem da zona de conforto pra realmente sentir a dor que o outro sente. Pelo menos parte dela. Assim, mesmo em mundos distantes, seremos capazes de enxergar humanidade ou gerar alguma réstia de compaixão.
Mas as terminologias também são capciosas e vamos nos ater aos fatos. ENTRE DOIS MUNDOS, que no título original, Le Quai De Ouistreham, traz o nome da cidade portuária na Normandia onde a história se desenrola, carrega na tradução já a informação de dois mundos incomunicáveis: aquele dos trabalhadores sem garantias ou estabilidade, em condições adversas e mal pagos, e o mundo daqueles que são reconhecidos e recompensados. Incomunicáveis porque o precarizado é invisível. Não há ponte possível.
Fã de Juliette Binoche que somos, não nos decepcionamos com esta personagem bastante simples, mas não simplória. Marianne está desempregada, resolve ir para Caen, uma pequena cidade na Normandia, onde ninguém a conhece. É um recomeço. O marido a abandonou e ela ficou sem grana e sem história profissional pra contar. Quer emprego de faxineira e vai à luta procurar uma oportunidade. A única que aparece é fazer faxina pesada nas balsas que saem do porto de Ouistreham rumo à Inglaterra. Faxina na madrugada, a toque de caixa, em condições bem precárias, antes do embarque dos passageiros que vão atravessar o Canal da Mancha.
Mas Marianne não é como as outras mulheres que estão nessa frente de batalha do dia a dia — e eu preferia que o trailer do filme não fosse estraga-prazer. Mas o que fica são reflexões pertinentes sobre a capacidade de sentirmos empatia por trabalhadores invisíveis, aqueles que limpam a nossa sujeira, pavimentam o chão que a gente pisa, constróem as cidades onde moramos. A gente continua achando que tudo isso cai do céu. É sobre a possibilidade de fazer parte de outras camadas sociais, mesmo não pertencendo a elas. A história de “cada uma no seu lugar” é cruel e se torna, aqui, ainda mais relevante pela atuação das atrizes brilhantes que acompanham Binoche neste recorte da vida como ela é.
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