HAPPY HOLIDAYS
Opinião
O gatilho é um acidente aparentemente simples. Mas ele puxo o fio de um novelo entranhado e cheio de nós. Um fio que conduz a comportamentos padronizados por uma sociedade patriarcal que julga e rotula. Que determina a jornada do indivíduo com consequências definitivas. No mosaico de personagens de, cada um tem seu ponto de vista. Colocar-se no lugar do outro pode ser um divisor de águas.
Rami é palestino, namora uma moça judia e, de comum acordo, decidem interromper a gravidez indesejada. Mas não vai ser fácil a partir desta primeira conversa, mesmo porque Rami está também enfrentando um drama financeiro. Sua família foi responsável por uma fraude, está sem grana e sua mãe, Hanan, não quer enxergar a realidade. Ela teima em casar uma das filhas com pompas e circunstâncias pra manter as aparências.
Mas Hanah tem outra filha, Fifi, que namora um médico que parece ser, aos olhos da mãe, um bom partido. Afinal, filhas mulheres precisam casar — e logo. Tudo como manda o figurino. É justamente Fifi que sofre o acidente-gatilho que citei acima e sai do padrão esperado pra uma mulher muçulmana. Lembram-se da namorada de Rami? Pois é, sua irmã, Miri, entra nesse rolo como médica, mãe de uma adolescente deprimida e mulher judia, presa nas convenções e expectativas sociais.
Filmado pelo diretor palestino Scandar Copti com atores amadores de uma maneira às vezes documental, HAPPY HOLIDAYS mostra pessoas presas num sistema social, racial, político e econômico rígido e cruel, de recompensas e punições.Cada capítulo é o ponto de vista de um personagem. Pra provocar a reflexão do espectador, o diretor propositalmente filma de maneira a deixar bem claro como nós também nos equivocamos facilmente nos pré-julgamentos.
Mas o que é inequívoco é o recorte através do olhar das mulheres israelenses e palestinas. Apesar de diferentes, elas estão presas na rede do patriarcado, que contamina toda a sociedade e se repete. Aliás, isso está no título: os feriados reforçam a cultura e a tradição de um povo. Em Israel isso não é diferente e é algo vivenciado também pelos palestinos que moram ali. Mas na língua árabe, o termo “happy holidays” tem significado duplo: significa também ao desejo de que algo se repita mais vezes. O acidente de Fifi acontece num feriado, mas é como se sua história de vida estivesse fadada a ser uma repetição de opressões, como tem sido com as mulheres desde sempre.
Neste complexo mosaico de vidas o que se tem é uma rede de valores, tradições e normas culturais e religiosas. Todos estão interconectados e o filme é um convite a essas reflexão: quebrar os padrões liberta, dá voz aos silenciados e dispara o efeito dominó de recuperação dos valores individuais e inquestionáveis de cada um.
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