CENTRAL DO BRASIL
Opinião
Central do Brasil já faz 20 anos e foi ele que definitivamente colocou o Brasil no circuito internacional. Foi premiado no mundo todo (Bafta, Globo de Ouro, Festival de Berlim, além de ter tido várias indicações, inclusive no Oscar). Difícil esquecer a essência humana da obra-prima de Walter Salles (também de Diários de Motocicleta, Linha de Passe), mas alguns detalhes vão ficando para trás.
Filmes como este não envelhecem. São referências em vários aspectos, a começar pela sua importância no posicionamento da produção brasileira no mercado nacional e internacional, na renovação do cinema brasileiro como arte, roteiro, capacidade criativa, inteligência – inclusive emocional – de lidar com temas sensíveis, humanos e muito sutis. Portanto, quem não assistiu, faça isso logo. Quem já viu, garanto que se emocionará de forma diferente e com mais intensidade. Não vai se arrepender.
Dora (Fernanda Montenegro, também em Casa de Areia) ganha a vida escrevendo cartas na Central do Brasil, no Rio. Escreve em nome de pessoas analfabetas, que querem mandar uma mensagem para parentes e amigos em outras cidades. Ela e a irmã Irene (Marília Pêra) vivem de rolos e trambiques, numa vida que mostra bem a realidade da periferia do Rio e das grandes cidades brasileiras, com extrema desigualdade social, luta diária pela sobrevivência, violência e impunidade. A Central do Brasil aqui é uma metáfora fortíssima da migração de milhares de brasileiros para as grandes cidades em busca de uma vida melhor, do centro onde se reúnem todas as crenças e esperanças, onde pessoas se encontram, chegam e partem para todos os lugares do Brasil, a procura de emprego, de amor, do pai, da mãe, do filho, do dinheiro, da saúde – a grande simbologia do filme.
Um dia, Ana e seu filho Josué pedem que ela escreva uma carta para o pai do menino, que os abandonou. A partir daí, a relação de amizade e respeito entre Dora e Josué é inevitável. Vai sendo construída à medida que desconstrói a Dora rígida e amarga, trazendo à tona as lembranças, tristezas, arrependimentos por que passou no decorrer da vida. O lado humano é forte, a emoção latente – mérito de Walter Salles que dirige Fernanda Montenegro e Vinícius Oliveira (também em Assalto ao Banco Central, Linha de Passe) com maestria. Não dá para não se emocionar. Assista a Central do Brasil – e depois pensa se achou o filme “velho”.
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