AFTERSUN

Cartaz do filme AFTERSUN

Opinião

Se alguém nos pedir pra contar como foram nossas férias de verão qdo tínhamos 11 anos, provavelmente vamos lembrar mais de sensações do que de fatos. São flashes borrados, que ao serem lembrados acessam a memória afetiva e nos fazem compreender o que éramos naquele momento e que relações tínhamos com aquelas pessoas. Não há nada como o distanciamento temporal pra olhar com clareza para o passado e entender que sentimentos foram plantados tão fortemente na infância!

É natural que AFTERSUN seja assim, borrado. É como Sophie adulta lembra das férias com o pai na Turquia, quando tinha 11 anos. É ali que ela vive seu rito de passagem, sua transição para a adolescência, sensação que ela revisita agora adulta, mãe, revendo os vídeos que gravou na época.

Este é o primeiro longa de Charlotte Wells, que resgata sua memória para escrever e dirigir esta história. Assistimos com o olhar de Sophie, com as imagens que ela julgou importantes gravar. Todas de ternura, afeto, brincadeiras. É assim que ela se lembra dele. Mas também é nelas que identifica agora os sinais da sua instabilidade emocional e da sua perda.

AFTERSUN é sobre o que veio depois do sol, depois daquele verão. São memórias da presença paterna neste vazio que se instalou. Ele dizia que ela poderia ser o que quisesse, porque tinha tempo. Pra eles dois juntos, seria pouco tempo.

Charlotte filma com ternura, regada à nostalgia e ares melancólicos, com toque musical dos anos 90. Reconstrói sua própria dor, sem precisar dar a ela um fim, nem explicação. Fica borrado, subentendido, universalmente compreendido como um relacionamento intenso e profundo, capaz de despertar em nós o que cada história pessoal comporta.

Tudo isso pra dizer que AFTERSUN é tão óbvio quanto uma relação entre pai e filha pode ser. Ou seja, nada evidente. É único, particular, com camadas mil pra nos deliciarmos com tamanha sensibilidade.

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