A LESTE DE BUCARESTE – A fost sau n-a fost?
Opinião
Logo após a queda do Muro de Berlim em novembro de 1989 (relatada no ótimo filme Adeus, Lênin!), o efeito dominó atingiu os países do leste europeu, derrubando definitivamente a cortina de ferro da ex-União Soviética. Na Romênia não foi diferente. Em Bucareste, o ex-ditador Ceausescu é deposto em 22 de dezembro daquele ano – um reflexo do conflito iniciado entre manifestantes e polícia em uma cidade vizinha.
Diante dos acontecimentos que mudaram o mapa da Europa, uma pequena cidade a leste de Bucareste se pergunta, depois de 16 anos, se realmente participou dessa mudança e fez uma revolução. Essa é a sugestão de um apresentador de televisão em seu programa. O filme gira em torno dessa questão e trata, com um humor sutil, tristeza e desilusão, o significado real dessa mudança para o povo e no povo em si.
A dita melancolia é transmitida pelo panorama da tal cidade, sem graça e mal cuidada; por seus habitantes (pelo menos a amostra coletada pelo diretor, vencedor do prêmio de Cannes aos novatos, o Camera D’Or), apáticos, que vivem uma crise existencial e familiar, fazem pinta de trapaceiros, como quem precisa tirar vantagem da situação por pura falta de opção. Na indiferença diante de qualquer mudança positiva que a tal revolução possa ter trazido, um grupo de estudantes chega ao cúmulo de sugerir a revolução francesa como tema de um trabalho – nem a revolução no próprio país exalta os ânimos, nem sequer é lembrada.
Pensando um pouco nos recentes filmes romenos (vejam também Casamento Silencioso), a semelhança entre eles é no mínimo curiosa. Ambos lançam mão da ironia e do humor sutil – que precisam ser percebidos nas entrelinhas – para tratar do grande estrago que o comunismo fez na alma do povo. As cicatrizes são tão visíveis que fiquei com a impressão de serem puros saudosistas – por ser o passado seu mais valioso patrimônio. Impressão de que só as novas gerações serão capazes de viver o presente olhando para o futuro; de que quem viveu a realidade do país fechado, reprimido, estatizado, carente de tudo não sabe valorizar o indivíduo, muito menos a si próprio. É uma crise de identidade e de maturidade, típicos de quem não aprendeu a andar com as próprias pernas. Se replicarmos essa visão aos tantos outros países na mesma situação, tem uma parte da Europa em sérios apuros.
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