O PROFETA – Un Prophète

Cartaz do filme O PROFETA – Un Prophète

Opinião

O fio condutor de um filme muito bem amarrado e executado, como é o caso de O Profeta, é capaz de transmitir, de forma muito clara, a ideia central de todo o projeto. Com a competência extrema na construção do seu protagonista, que é a espinha dorsal, Jacques Audiard consegue transferir para o espectador a mais cruel e verdadeira realidade das prisões francesas. Sem roteiro e direção tão precisos e criteriosos, ator nenhum faria o que Tahar Rahim fez com seu Malik: o menino francês de origem árabe, assustado, analfabeto e inexperiente no crime e na vida, aprende a profissão, descobre a inteligência e desenvolve a astúcia. Tudo dentro da escola da vida que é a prisão.

O diretor disse em entrevista que o filme Carandiru, de Hector Babenco, foi fonte de inspiração. É verdade também que resolveu filmar essa questão das máfias regionais que atuam na França e em toda a Europa depois que foi dar uma palestra dentro de uma penitenciária. Impressionou-se e retratou em O Profeta a prisão como ela é. Não há panos quentes, nem a sensação de caos exagerado. Na prisão, presenciamos a mais pura realidade, onde impera a hierarquia (mesmo que extorquida), o poder, a inteligência e perspicácia de quem tem maior capacidade de adaptação. É a seleção natural, vivida por Malik desde que sucumbe ao poderio do chefe corso Cesar (o ótimo Niels Arestrup) e alia-se à máfia da Córsega para não morrer e ganhar proteção, desde que se apropria da estrutura e da dinâmica do presídio, que aprende a ler e escrever, ganha confiança dos árabes muçulmanos e passa a estampar no rosto um sorriso de quem tem as rédeas da vida nas mãos.

Quem fala de máfia, mostra violência, intriga, sangue, manipulação e poder, ascensão e queda. Portanto, espere um filme forte – muitas vezes, angustiante. Mas acompanhar a trajetória do árabe Malik é quase irresistível, seja quando é controlado e usado, quando controla e usufrui, ou quando mostra seu lado amigo com o Ryad (Adel Benchérif). Sugere, inclusive, que pode ter continuação, estilo trilogia de O Poderoso Chefão. Arriscado. Um filme tão premiado como este (vencedor do César de melhor filme, ator, roteiro, diretor, fotografia, edição e do Grand Prix em Cannes – perdeu a Palma de Ouro para A Fita Branca; indicado para o Oscar de melhor filme estrangeiro – perdeu para o argentino O Segredo dos seus Olhos) talvez fique melhor sem uma sequência. Ou não. Talvez nós ganhemos outra grande obra ao saber que rumo tomou Malik. O final sugere, mas não define. E isso deixa um gostinho amargo na boca. O que O Profeta não tem de doce, tem de competente e, paradoxalmente, de humano.

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