É TUDO VERDADE _ 2024

De 3 a 14 de abril, o É TUDO VERDADE apresenta sessões gratuitas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Nesta 29ª edição, o FESTIVAL INTERNACIONAL DE DOCUMENTÁRIOS conta com 77 títulos, de 34 países, longas e curtas, além de uma programação especial com atividades de formação como palestras e conferências.

Para acessar a PROGRAMAÇÃO: CLIQUE AQUI

Para celebrar o É Tudo Verdade, o podcast Sessão Cine Garimpo apresenta um episódio dedicado ao gênero documental, que você pode acessar no link abaixo:

  • episódio #9: Vai um documentário aí?, por Suzana Vidigal (podcast Sessão Cine Garimpo, disponível nas plataformas de áudio)

Seguem alguns filmes da seleção de 2024 que já assisti e recomendo:

UM FILME PARA BEATRICE, de Helena Solberg (Brasil, 2024)

  • O que dá origem ao documentário é uma história curiosa: em 1968, Helena inscreve o filme “A entrevista” no Prêmio de Colli, na Itália; mais de 50 anos depois uma jornalista chamada Beatrice Andreose encontra este filme em perfeitas condições e entra em contato com Helena. No filme A entrevista, Helena conversa com mulheres com formação semelhante à dela pra falar da condição da mulher brasileira naquela época. Beatrice fica curiosa e quer saber mais sobre nós, mulheres brasileiras, e Helena então se debruça sobre sua própria filmografia revisitando suas reflexões sobre o Brasil e a América Latina. Conversa com pessoas hoje pra refletir sobre a trajetória feminina e entender em que ponto estamos. Tem política, tem feminismo, tem negritude, tem machismo, tem religião, tem paternalismo, tem política de novo. São análises riquíssimas sobre quem queremos ser.

HOJE É O PRIMEIRO DIA DO RESTO DA SUA VIDA, de Bel Bechara e Sandro Serpa (Brasil, 2024)

  • Em 2021, Bel e Sandro recebem a notícia de que chegou a sua vez na lista de espera da adoção. Um bebê de 4 meses integrará a família e eles documentam todo o processo neste filme intimista. Trazendo suas angústias, alegrias e reflexões, o casal conta como a chegada do pequeno muda suas vidas. A mais bela reflexão fica por conta da responsabilidade de criar um menino que não seja machista. Decidem subverter o padrão da posição dos sobrenomes materno e paterno, dando à mãe a posição considerada mais importante pelo patriarcado.

O COMPETIDOR (The Contestant), de Clair Titley (Reino Unido, 2023)

  • O filme nos coloca numa situação incômoda, cada vez mais comum hoje em dia. O COMPETIDOR conta a história de um programa de televisão no Japão nos anos 1990 cujo produtor queria ganhar notoriedade e entreter as pessoas a qualquer custo. Anos antes de surgir o Big Brother, ele criou um programa em que um sujeito apelidado de Nasubi foi mantido por 15 meses dentro de um quarto, nu, sozinho e com comida racionada e de péssima qualidade. 

    Nasubi tinha um desafio: sua missão era preencher os cupons das revistas pra tentar ganhar prêmios. Quando atingisse a meta, seria libertado. Sem que soubesse, foi monitorado 24 horas, 7 dias por semana, com transmissão nacional pela tv japonesa para milhões de espectadores. Mas peraí, já vimos este filme. O Show de Truman, filme de ficção feito anos mais tarde, é exatamente isso. Numa situação abusiva e tóxica, a saúde mental e física é testada no limite, mostrando o nível de ambição e crueldade do ser humano, tanto da mídia, que produz entretenimento às custas do sofrimento de alguém, quanto dos espectadores, que consomem este tipo de produto sem questionar a violência intrínseca, o desrespeito e a invasão de privacidade. Convenhamos: é um triste prenúncio do Big Brother e da transformação de pessoas em meros produtos de marketing. O desfecho é surpreendente e é tudo verdade!

CENTO E QUATRO (One hundred four), de Jonathan Schörnig (Alemanha, 2023)

  • Cento e quatro pessoas estão à deriva num bote de borracha furado, perto da fronteira da Líbia. Vindos de países africanos, buscam refúgio na Itália, mas neste barco afundarão em breve. Acompanhamos o resgate desses refugiados em águas internacionais através de 6 câmeras, pressionados pelo tempo que o barco resistirá, pela possibilidade de patrulhas líbias violentas surgirem, pela dificuldade de conseguir autorização para desembarcar na Itália ou França. Angustiante, CENTO E QUATRO é um retrato importante dessa ação de resgate humanitário.

E ASSIM COMEÇA (And so it begins), de Ramona S. Diaz (EUA, Filipinas, 2024)

  • As eleições de 2022 são pano de fundo para a reflexão sobre a política no país, seu histórico de corrupção e perseguição à opositores e jornalistas. Quem tem voz aqui é a jornalista Maria Ressa, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz e cofundadora do veículo de jornalismo investigativo, que traz sua experiência de censura, opressão e violência sofridas pelo governo para refletir sobre o poder e a política naquele país. 

O CINEMA POR DENTRO (The cinema within), de Chad Freidrichs (EUA, 2023)

  • Pra pensar sobre as ferramentas do fazer cinema,  a edição é peça-chave para o entendimento de um filme, já que o ponto de vista do diretor depende de uma edição coerente com o tom que ele quer transmitir. Este filme constrói uma linha de raciocínio que mostra a importância da montagem na construção da história na nossa mente.

     Baseado em uma pesquisa feita por uma estudiosa com moradores das montanhas da Turquia que nunca tinham visto um filme na vida, o diretor vai discorrer sobre a importância de a edição simular o nosso processo mental. Nossa mente estabelece relações entre o que vemos e nosso conhecimento prévio de mundo o tempo todo e a edição tem que surtir o mesmo efeito pra que aquela história transmitida na tela faça sentido. Acompanhar uma narrativa e envolver-se com ela depende de como nosso cérebro é capaz de processar os signos colocados ali pelo diretor, considerando que produzimos fragmentos da realidade o tempo todo, observando tudo que acontece ao nosso redor. Numa edição sensível e cuidadosa, entre uma piscada d’olhos e outra, acreditamos que tudo aquilo que está na telona é a mais pura verdade. Como num passe de mágica.

MORRE CINEASTA EDUARDO COUTINHO

Encontrado morte hoje no Rio, o cineasta Eduardo Coutinho (81) deixa um legado de documentários não só muito interessantes, mas principalmente humanos. Com alma. Cito alguns abaixo que merecem ser vistos e sentidos.

Edifício Master (2002) – Humano, revela onde cada habitante se esconde e se mostra. (foto)

Jogo de Cena (2007) – Feminino, contraste ficção e realidade.

Moscou (2009) – Teatral, com a vida como palco.

As Canções (2011) – Musical, na sua mais íntima inspiração.